Venda de aço barato da China continua prejudicando a siderurgia da América Latina
Venda de aço barato da China continua prejudicando a siderurgia da América Latina
O afluxo sem precedentes de aço barato proveniente da China ao longo de 2024 levou os países latino-americanos a enveredar ao protecionismo. Um após o outro, os países da região impuseram tarifas sobre as importações de aço chinês, em uma tentativa de proteger as suas indústrias siderúrgicas nacionais da concorrência barata. A estratégia de dumping da China em relação ao aço provocou uma crise na indústria siderúrgica latino-americana, levando ao encerramento de grandes empresas e pondo em risco centenas de milhares de postos de trabalho na região.
A situação está longe de estar resolvida. Segundo a Reuters, as siderúrgicas chinesas deverão continuar a aumentar os embarques em 2025, o que provavelmente agravará a situação já vulnerável da indústria siderúrgica latino-americana. México, Brasil, Chile e, mais recentemente Colômbia, reagiram, aumentando os impostos sobre os produtos siderúrgicos provenientes da China.
As tentativas de Pequim de aumentar sua influência na América Latina têm provocado cada vez mais revolta, informou a agência de notícias alemã DW. Entre as últimas vítimas, e talvez a mais emblemática da influência econômica da China, está a maior siderurgia do Chile, Huachipato, que encerrou 74 anos de operações, ao fechar o seu forno principal em setembro, marcando o fim de uma era para a indústria siderúrgica da região, devido à intensa e desleal concorrência da China.
Para a cidade portuária de Talcahuano e os seus 160.000 habitantes, que fazem parte da região chilena de Biobío, o fechamento da Huachipato significou a perda do seu motor económico. Cerca de 2.700 trabalhadores foram diretamente afetados, enquanto outras 20.000 pessoas indiretamente ligadas à empresa foram impactadas, indicou a organização não governamental Fundación Andrés Bello. O fechamento da Huachipato também tem repercussões a nível nacional, uma vez que os sindicatos locais estimaram que mais da metade dos trabalhadores que perderam os seus empregos têm mais de 50 anos, o que complica as suas possibilidades de reemprego.
O fechamento da siderúrgica também afetou mais de 1.000 pequenas e médias empresas locais, aumentando potencialmente o desemprego na região para 11 por cento, acrescentou a Fundación Andrés Bello. O fechamento da siderúrgica de Huachipato terá um impacto no Produto Interno Bruto (PIB) regional de 3 por cento, segundo estimativas da Universidade Católica da Santíssima Concepción, em uma área que contribui com quase 6 por cento para o PIB do Chile.
“Trabalhei na Huachipato; meu pai trabalhava na Huachipato, minha esposa também era operária da Huachipato, e tínhamos um bom padrão de vida”, disse à AFP, em 13 de setembro, Fernando Orellana, de 62 anos, que começou a trabalhar na limpeza da empresa aos 25 anos e foi promovido a chefe do setor.
Roberto Hernández, outro trabalhador siderúrgico que perdeu o emprego, descreveu a situação como ‘terrível’. “Onde vou encontrar trabalho nesta idade?”, pergunta à AFP o trabalhador de montagem, de 54 anos.
A indústria do aço na América Latina gera 1,4 milhão de empregos diretos e indiretos e é fundamental em diferentes setores econômicos estratégicos, de acordo com um comunicado da Associação Siderúrgica Latino-Americana (Alacero), em 1º de novembro.
O Brasil, que é o nono produtor mundial e o maior da América Latina, com 10 usinas de grande porte, já dá sinais de ser afetado pelo aço chinês. Em 2023, as importações da China aumentaram em 50 por cento e a produção caiu em 6,5 por cento, de acordo com o Instituto Aço Brasil. No final de 2023, a Usiminas desligou um forno, devido ao volume de importação da China. A Gerdau, uma das maiores siderúrgicas do país, demitiu, até abril de 2024, 700 trabalhadores, devido ao “cenário desafiador enfrentado pelo mercado brasileiro, diante das condições predatórias das importações chinesas de aço”, informou a empresa em um comunicado à AFP, em 18 de abril.
Os países da América Latina estão tentando reagir. Em outubro, o Brasil impôs novas tarifas sobre as importações da China de até 25 por cento, em uma tentativa de combater o dumping e “proteger a indústria nacional dos danos causados por essa prática”, disseram as autoridades, que foram as mesmas impostas pelo México sobre 205 tipos de produtos siderúrgicos. No México, o aço é responsável por 1,4 por cento do PIB e gera 700.000 empregos.
“A queda da produção, em um contexto de diminuição do consumo e de aumento das importações, reflete a necessidade de a região procurar estratégias que fortaleçam a sua indústria local e reduzam a vulnerabilidade ao mercado internacional”, destacou em um comunicado à Diálogo Ezequiel Tavernelli, diretor executivo da Alacero.
Alacero explicou que o aumento das importações de aço chinês na América Latina continua a ameaçar a indústria regional, dado que os produtos chegam à região a preços abaixo dos do mercado, vindo de um país que fornece apoio financeiro à sua indústria siderúrgica fora das regulamentações da Organização Mundial do Comércio (OMC), e muitos desses subsídios violam os acordos da OMC.
“Nossa região apresenta uma das melhores performances ambientais na produção de aço, com emissões de 1,55 toneladas de CO? por tonelada de aço bruto”, destacou José Fonrouge, diretor global sênior de Sustentabilidade da siderúrgica brasileira Ternium e presidente do Comitê de Políticas Ambientais da Alacero, em um comunicado à Diálogo. Esse índice está bem abaixo da média mundial – de 1,91 toneladas de CO? por tonelada de aço bruto –, e é cerca de 25 por cento menor do que as emissões geradas na China, acrescentou.
Em novembro de 2024, a Alacero havia registrado 373 denúncias de dumping na OMC contra a China.
Fonte: Diálogo Américas
Seção: Siderurgia & Mineração
Publicação: 07/01/2025