Siderurgia brasileira alerta para aumento da importação de aço chinês após tarifas dos EUA

Siderurgia brasileira alerta para aumento da importação de aço chinês após tarifas dos EUA

As recentes políticas protecionistas adotadas pelo governo dos Estados Unidos, que incluem a imposição de tarifas adicionais de 10% sobre produtos chineses, têm gerado preocupações no setor siderúrgico brasileiro. Com as restrições ao aço chinês no mercado norte-americano, cresce o receio entre executivos de que o excedente da produção asiática seja redirecionado para outros mercados, incluindo o Brasil.

A entrada do aço chinês nos mercados latino-americanos já é motivo de preocupação, já que, segundo os fabricantes da região, causou a estagnação da indústria local, provocando um processo de desindustrialização. O setor alerta que a ampliação desse fluxo, impulsionada pelas barreiras comerciais dos Estados Unidos, pode intensificar a competição desleal, pressionar os preços e comprometer ainda mais a sustentabilidade da siderurgia nacional.

A presidente da Aço Verde Brasil, Silvia Nascimento, destacou que a intensificação das tarifas pelos Estados Unidos pode resultar em um desvio significativo do aço chinês para o mercado brasileiro. Segundo a executiva, a China é estratégica e está atenta ao movimento global contra suas exportações.

Para ela, basta observar os investimentos crescentes no Vietnã, na Indonésia e em outros países do Sudeste Asiático – em grande parte, financiados pelo próprio capital chinês. Essa seria uma forma de contornar barreiras comerciais e manter sua influência no mercado global.

“Há uma questão de preço e uma necessidade de exportação. Diante disso, eles [os chineses] reduzem os valores para se tornarem mais competitivos no mercado. Como o governo brasileiro nos envolve nessas negociações? Quer dialogar? Quer discutir a descarbonização da indústria nacional? Estamos falando de aproximadamente 10 milhões de toneladas de aço chinês, considerando tanto o direto quanto o indireto – um dos mais poluentes do mundo. Como é possível exigir padrões ambientais elevados da indústria nacional enquanto se permite a entrada de um aço altamente poluente no Brasil?”, questiona.

O setor acusa Pequim de “inundar” a região com aço barato por conta do subsídio estatal e produção em excesso. Em resposta a essas preocupações, o governo brasileiro anunciou recentemente a implementação de cotas para a importação de aço e o aumento do Imposto de Importação para 25% sobre volumes que excedam essas cotas. Essa medida visa conter a “invasão” do aço chinês e proteger as siderúrgicas locais.

Mesmo assim, a expectativa do setor é que a escalada do aço chinês entrando no mercado nacional deve se manter firme em 2025, já que as medidas para conter a enxurrada de importações do país asiático ainda não surtiram o efeito desejado pelas siderúrgicas locais, segundo o Instituto Aço Brasil.

Trump também reforçou sua política comercial protecionista ao impor tarifas sobre produtos importados do México e do Canadá, com a União Europeia como próximo alvo. Em resposta, esses países têm retaliado com a aplicação de tarifas adicionais sobre produtos dos Estados Unidos.

“Com a implementação de barreiras comerciais pelos Estados Unidos e as medidas de defesa adotadas pela Europa, a gente percebe claramente que o excedente de aço chinês acaba sendo redirecionado para outros mercados. A China, com sua capacidade produtiva excedente, busca novos destinos para escoar sua produção. Nesse cenário geopolítico, o Brasil precisa ficar em alerta, avalia o presidente da Aperam América do Sul, Frederico Ayres.

A China sozinha produz mais aço do que o restante do mundo combinado. Diante das barreiras impostas pelo protecionismo dos Estados Unidos, o vice-presidente sênior da Vallourec América do Sul, André Lacerda, questiona o destino desse excedente de produção. Ele ressalta que, embora o Brasil possua alguns mecanismos de proteção para a indústria siderúrgica, eles ainda estão longe de ser plenamente eficazes.

"A gente viu o aumento da importação chinesa no Brasil. Entre 2022 e 2023, o aumento foi superior a 40%, seguido por um acréscimo adicional de 20% entre 2023 e 2024. Esse avanço contínuo tem gerado preocupações no mercado, especialmente sobre até que ponto esse crescimento pode se sustentar e quais serão os impactos para a economia brasileira."

Paulo Hartung, ex-governador do Espírito Santo e atual presidente da Indústria Brasileira de Árvores (Ibá), enfatiza que a guerra tarifária desorganiza a corrente de comércio mundial e há a necessidade de aprimorar o sistema de cotas e tarifas para proteger a indústria nacional da concorrência desleal.

Especialistas alertam que, embora essas medidas sejam necessárias, é crucial monitorar continuamente o mercado global e ajustar as políticas comerciais conforme necessário para garantir a competitividade da indústria siderúrgica brasileira.

Maior fabricante de aço no Brasil, a ArcelorMittal responde por mais de 40% da produção nacional, o que equivale a 15,5 milhões de toneladas de aço bruto. A empresa acompanha de perto o cenário, mas, segundo o CEO da linha de aços longos, Everton Negresiolo, ainda é difícil prever os desdobramentos, embora seja certo que trará instabilidade ao mercado.

Do ponto de vista ambiental, a saída dos EUA do Acordo de Paris deve reacender debates globais, enquanto a COP30, que será realizada no Brasil, pode destacar as vantagens de uma produção siderúrgica mais sustentável. No entanto, a resistência do consumidor em pagar o chamado “green premium” — o custo adicional de produtos com menores emissões de carbono — segue como um obstáculo para essa transição.

Fonte: Valor
Seção: Siderurgia & Mineração
Publicação: 05/02/2025