Riscos de crises e de recessão crescem na economia mundial

Riscos de crises e de recessão crescem na economia mundial

A economia global encerrou o segundo trimestre em contração e seus piores momentos ainda estão por vir, avalia o Fundo Monetário Internacional em seu Panorama da Economia Mundial. Na metade final do ano, países que compõem um terço do PIB mundial registrarão dois trimestres consecutivos de queda. O Fundo manteve a previsão de crescimento global de 3,2% neste ano e rebaixou a do ano que vem a 2,7%. O nível corrente de atividade já é inferior ao da média deste século (2000-2021), de 3,6%.

O relatório do Fundo confirma que tudo o que poderia dar errado está dando, em uma sucessão de choques que produziu um desafio inédito em quatro décadas - inflação elevada e persistente nas economias avançadas. Os fatores de incertezas, que correm risco de se intensificarem, são conhecidos. Os preços dos alimentos e commodities dispararam ao fim da pandemia, os programas bilionários de auxílio financeiro elevaram a demanda quando as cadeias de produção haviam sido rompidas, e seguem causando distúrbios com a volta da covid-19 a seu berço de origem, a China, que continua combatendo-a da mesma forma: com rígidos lockdowns envolvendo centenas de milhões de pessoas em cidades economicamente importantes.

O mais recente impulso inflacionário e de ruptura na produção veio da invasão da Ucrânia pela Rússia. Os preços da energia quadruplicaram na Europa e subiram no resto do mundo. O fornecimento de gás russo, do qual os europeus dependem, é hoje de 20% do que foi. O custo subiu e pode subir ainda mais no inverno, em uma mudança do setor de energia que o FMI qualifica de estrutural. Com isso, a inflação chegou perto de 10% nas economias desenvolvidas e passou disso nas emergentes. A variação do nível de preços global será de 8,8% em 2022, 6,5% em 2023 e 4,1% em 2024. Seu pico será no segundo semestre, com a média dos emergentes atingindo 11%, magnitude não vista desde 1990, no século passado.

A reação aos efeitos dos vários choques adversos foi a elevação forte e rápida das taxas de juros em toda parte, com particular intensidade nos países da Europa e nos Estados Unidos, acostumados a juros muito baixos ou negativos por mais de uma década. Com a reação unidirecional dos bancos centrais, na maior parte do planeta, as chances de recessão global cresceram. Não é ainda o cenário do FMI, que a restringe em 2023 à Alemanha e Itália. O relatório disse que há 25% de chances de o crescimento global ser inferior a 2% em 2023 e 10% de probabilidade de recessão.

O aperto da política monetária trouxe mais riscos para a economia global, além da ameaça de recessão. O dólar, pelo ritmo agressivo de aumento dos juros do Federal Reserve, disparou em relação a quase todas as moedas, colocando pressão adicional sobre países emergentes e pobres que são muito endividados na moeda americana. Ao mesmo tempo, os fluxos de recursos estão de novo deixando esses países e procurando o porto seguro dos títulos americanos.

O dólar valorizou-se no ano 15% em relação ao euro, 10% sobre a moeda chinesa, 20% sobre a libra esterlina. Em vários países, isso contribui para elevar uma inflação já alta e forçar uma política monetária ainda mais restritiva para diminuir o diferencial de juros favorável aos EUA, que aprecia o dólar, provocando crescimento menor e asfixiando a capacidade de pagamento diante de uma dívida maior.

Juros mais altos nos EUA e maior força do dólar podem criar crises de dívida em vários países. Títulos soberanos de 14 nações estão com prêmio de risco superior a 10 pontos percentuais em relação ao do Tesouro dos EUA, seis dos quais estão em default. Outro relatório, o de Estabilidade Financeira Global, o Fundo registra que um teste de estresse com premissas menos favoráveis que o do cenário atual faria com que alguns bancos dos países desenvolvidos e 29% dos maiores bancos de países emergentes necessitassem capital adicional.

O Brasil deve crescer 2,8% este ano, abaixo da média dos emergentes, um pouco abaixo da média mundial, de 3,2%, e bem abaixo da dos emergentes, de 3,7%, estima o FMI. Em 2023, a previsão para o Brasil recua a 1%. Os países mais ricos estão tendo maior peso na desaceleração global. Com os choques de 2022, o PIB global em 2024 será 4,6% menor do que seria se a tendência de crescimento anterior à pandemia prevalecesse.

O FMI recomenda o prosseguimento do aperto monetário para debelar a inflação. Como também pensa o Fed, segundo ata divulgada ontem, o risco maior hoje é errar para menos, e não para mais.

Fonte: Valor
Seção: Indústria & Economia
Publicação: 13/10/2022