Exportador sofre com real valorizado e custos mais altos

Exportador sofre com real valorizado e custos mais altos

Custos mais altos e valorização do real frente ao dólar contribuíram para tirar parte da margem de ganho do exportador até o terceiro trimestre do ano, apesar de preços favoráveis. De janeiro a setembro, o índice de rentabilidade do total das exportações brasileiras caiu 3,9% contra iguais meses do ano passado. O resultado mostra que o ganho com a elevação de 15,2% nos preços médios em dólar de exportação não foi suficiente para mitigar os efeitos do aumento de 15,4% nos custos de produção e da valorização nominal de 3,7% da moeda nacional frente ao dólar em igual período.

Em setembro, na comparação com igual mês do ano passado, a rentabilidade das exportações totais caiu 4%, com dinâmica parecida dos componentes que influenciam na margem do exportador, embora com variações de magnitude bem menor. Em setembro, na comparação interanual, a alta de 5,5% dos preços de exportação não foi suficiente para anular os efeitos do aumento de 8,8% nos custos de produção e da valorização cambial de 1%. Os dados, levantados pela Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), devem ser divulgados nesta segunda.

Apesar do arrefecimento da inflação e da devolução de parte do aumento em alguns preços importantes, aponta Daiane Santos, economista da Funcex, as projeções de mercado para a taxa de câmbio nominal, a desaceleração da economia global, as contínuas restrições à circulação de pessoas na China para conter a covid-19 e os impactos da guerra entre Rússia e Ucrânia nos preços dos combustíveis mostram que o quadro não será revertido até o fim do ano. “Dificilmente veremos uma melhora na rentabilidade do exportador brasileiro no último trimestre de 2022.”

Os dados da Funcex mostram que a rentabilidade na exportação total brasileira em setembro em relação a agosto também caiu, embora com dinamismo diferente. Nessa comparação houve queda de 1,9% no custo de produção e desvalorização de 1,7% do real frente ao dólar, dois fatores que jogaram a favor da margem de quem exporta. Os preços médios de exportação, porém, recuaram 3,8% no período e isso fez a rentabilidade cair 0,4% no total das exportações.

Os custos de produção, observa Daiane, já começam a refletir o arrefecimento da inflação, sob efeito, entre outros, da redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre preços administrados, o que contribuiu para a queda do preço da energia, da gasolina e das telecomunicações. A gasolina, destaca, também recuou de preço por revisões praticadas pela Petrobras em resposta à redução do preço internacional do petróleo. O efeito é visível na margem. Na análise dos 29 setores que a Funcex acompanha, o custo médio só não caiu em um deles, o de “outros equipamentos de transporte, exceto veículos”, no qual houve alta de 0,7%. No setor de derivados de petróleo, biocombustíveis e coque o custo médio de produção caiu 10,8%, maior queda entre os segmentos observados.

O recuo do custo de produção de agosto para setembro também contribuiu para o avanço de rentabilidade em 19 dos 29 setores analisados. Entre os setores que mais exportam, destaca-se avanço da margem de lucro em produtos alimentícios, com alta de 2%, e em máquinas e equipamentos e veículos, nos quais a alta foi de 5,6% e 4,1%, respectivamente.

Quando se olha o acumulado do ano, porém, apenas oito dos 29 setores tiveram ganho de rentabilidade. As maiores altas estão em atividades ligadas a commodities que experimentaram alta de preços no decorrer do ano. O setor de derivados de petróleo mostra o maior avanço de rentabilidade, de 29,6%, seguido por extração de petróleo e gás, com 25,6%, e agricultura e pecuária, com 13,9%.

Apesar da queda dos custos de produção na margem, porém, os dados da Funcex mostram que esse componente da rentabilidade segue em nível elevado. No acumulado em 12 meses a alta ainda é de 17,5%. Os níveis altos de custos de produção ainda devem continuar tirando rentabilidade do exportador em 2023, diz Welber Barral, sócio da BMJ Consultores e ex-secretário de Comércio Exterior.

Há ainda, diz ele, uma inflação mundial muito influenciada por itens de energia, o que continuará pressionando preços no mercado doméstico, e também os custos logísticos do comércio global, tirando margem do exportador. “Poderia haver reversão disso com uma solução para a tensão geopolítica entre Rússia e Ucrânia, mas tudo leva a crer que isso não irá acontecer antes do fim do inverno [do hemisfério Norte].” Mesmo que um acordo venha a selar o fim da guerra, avalia, os preços demorariam para devolver o que subiram.

Ao mesmo tempo, diz Barral, o cenário global não deve ajudar. “A União Europeia, destino de cerca de 16% das exportações brasileiras, está sob risco de recessão em 2023 e é esperada uma desaceleração do crescimento da China, nosso principal comprador.” Isso terá impacto sobre preços de commodities que o Brasil exporta, principalmente minério de ferro, ressalta.

“É preciso lembrar também que depois de 2020 aumentou muito a rentabilidade do exportador”, destaca Barral. Apesar das oscilações mais recentes do câmbio em razão das atuais discussões sobre o teto de gastos e sobre o orçamento do governo federal para 2023, a tendência para o dólar é fechar 2023 em torno de R$ 5,20, diz. “É um câmbio bom para o exportador, mas não é o câmbio excelente de 2020, quando se chegou a exportar com dólar a R$ 5,80.”

De qualquer forma, mesmo com perda de rentabilidade do exportador, diz Barral, a balança comercial brasileira deve fechar 2022 e o próximo ano com superávit robusto e contribuir positivamente para o setor externo. A exportação brasileira, avalia, deve se beneficiar ainda pelos preços favoráveis de alimentos. Para 2022, a mediana de projeções coletadas pelo Valor Data junto a 12 consultorias e instituições financeiras aponta para superávit comercial de US$ 59 bilhões.

Haroldo Ferreira, presidente-executivo da Abicalçados, que reúne a indústria brasileira calçadista, diz que uma menor demanda global já está no quadro esperado para o ano que vem. Isso mais a maior competitividade da China devem levar à redução dos embarques de calçados em 2023. Neste ano, ressalta, a exportação brasileira de calçados cresceu mais de 28% no acumulado até outubro em relação a 2022 e 9% contra o período pré-pandemia. Para ele, a composição da pauta exportadora, com participação mais importante de calçados de couro, com preços médios maiores, contribuiu para o avanço.

Fonte: Valor
Seção: Indústria & Economia
Publicação: 21/11/2022