China é o verdadeiro alvo da taxação global de Trump sobre o aço
China é o verdadeiro alvo da taxação global de Trump sobre o aço
A sobretaxa que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, impôs sobre os países exportadores de aço tem como verdadeiro alvo sua grande rival, a China. Maiores produtores de aço do mundo, os chineses driblam a taxação americana inundando outros mercados com seu produto, depois revendido para os EUA.
O que aconteceu?
A manobra chinesa é conhecida como "transbordo" ou "comércio de trânsito". É quando países compram produtos mais baratos, como o aço chinês, e revendem para outros países. Dessa forma, a China evita a tarifa de 25% —imposta pelos EUA desde 2018— e coloca seu produto no mercado americano como se tivesse sido produzido em outros países.
O México, por exemplo, importa da China o ferro gusa (usado para produzir aço) e exporta para o país vizinho. "Trump tratou disso no anúncio de segunda (10). Os EUA vão fiscalizar para evitar essa triangulação", diz Welber Barral, ex-secretário de Comercio Exterior Do Brasil e sócio da Consultoria Barral M Jorge.
Antecessor de Trump, Joe Biden já havia tentado frear a manobra. "No ano passado, ele conversou com o governo mexicano para que o aço exportado daquele país tivesse grande porcentagem de produto nacional: ou seria mexicano ou haveria taxas adicionais", diz o economista Rodrigo Scolaro, da Gep Costdrivers.
Ao invés de mandar para os EUA, a China envia parte da sua produção para o México, que reenvia para os EUA como se fosse a produção mexicana.Rodrigo Scolaro, economista
Canadá, países asiático, como o Vietnã e Malásia, e até o Brasil fariam o mesmo em alguma proporção. "A gente tá importando muito material chinês e faz um pouco esse repasse, mas indiretamente", diz Scolaro. "Quando o aço chinês —que é mais barato— entra no Brasil, as empresas nacionais se livram do fluxo vendendo o aço brasileiro para os EUA a preço baixo, canibalizando a margem de lucro."
O Instituto Aço Brasil diz que o Brasil não participa desse processo."O mercado brasileiro também vem sendo assolado pelo aumento expressivo de importações de países que praticam concorrência predatória, especialmente a China", diz a entidade em nota. "Ao contrário do alegado pelo governo americano, inexiste qualquer possibilidade de ocorrer, no Brasil, circunvenção para os Estados Unidos de produtos de aço oriundos de terceiros países."
Apesar de taxas adicionais impostas pelo governo, a importação de aço chinês não para de crescer no Brasil. Entre 2022 e 2023, esse aumento foi de 40%, e, entre 2023 e 2024, cresceu mais 20%, segundo estimativa da siderúrgtica Vallourec América do Sul.
Aço chinês invade o mundo
Sozinha, a China produz mais aço do que a soma da produção no restante do mundo. No início dos anos 1990, o gigante asiático passou a construir usinas siderúrgicas para abastecer sua construção civil, que consumia toneladas de aço. O setor imobiliário, por exemplo, construiu casas para centenas de milhões de chineses.
Nos últimos anos, porém, o setor de construção na China perdeu fôlego. O jeito foi vender para fora o aço excedente a preços até 20% mais baixos que a concorrência. Assim, os exportadores chineses inundam com seu aço diversos países, principalmente aqueles com baixa proteção a produtos vendidos a preço inferior ao custo de produção (dumping).
No ano passado, as fortes exportações de aço chinês bateram recorde. Atingiram o maior nível em nove anos: 110,72 milhões de toneladas, o que ajudou a China a compensar a baixa demanda interna. As exportações diretas para os EUA, porém, não passaram de 890 mil toneladas, 0,8% do total.
A superprodução da China está inundando os mercados globais e prejudicando gravemente os produtores e trabalhadores americanos.Michael Wessel, consultor do United Steelworkers of America
Brasil, Estados Unidos e União Europeia reclamam da competição injusta. "Há muitas siderúrgicas chinesas operando negativamente graças ao subsidio chinês", diz Scolaro. "Além disso, a produção chinesa é suja (poluidora) em comparação com a produção brasileira e europeia."
Guerra tarifária
Se as tarifas de Trump frearem o "transbordo", a China terá de se voltar para dentro. "Acredito que a China vai aumentar o crédito para aumentar a produção interna. Mas se a economia chinesa não reagir, será preciso controlar a produção de aço", diz Scolaro.
Antes, porém, a China buscará outros mercados. "Isso provavelmente vai representar novas tarifas sobre o mundo. Se a China exportar mais para a União Europeia, ela vai tarifar a China também", diz o especialista.
Muitas tarifas serão negociadas, mas existe chance delas escalarem também, criando instabilidades geopolíticas.
Fonte: UOL
Seção: Siderurgia & Mineração
Publicação: 12/02/2025