Brasil e Estados Unidos: 200 anos, novos horizontes
Brasil e Estados Unidos: 200 anos, novos horizontes
Por Marcelo Marangon e Abrão Neto
Neste mês, celebramos 200 anos das relações diplomáticas entre o Brasil e os Estados Unidos. Em 26 de maio de 1824, o então presidente norte-americano James Monroe reconhecia de forma pioneira a independência brasileira, dando início a uma parceria próspera e duradoura.
Ao longo dos dois últimos séculos, as duas jovens nações se tornaram as maiores democracias e economias das Américas. Ao mesmo tempo, a relação entre elas se fortaleceu, oferecendo um terreno generoso para avanços mútuos em áreas como cultura, educação, ciência e meio ambiente. Uma verdadeira relação ganha-ganha.
Mas foram os interesses econômicos e comerciais que, desde o início e com maior intensidade, impulsionaram a aproximação bilateral. Como resultado, os Estados Unidos se tornaram o principal parceiro econômico do Brasil, considerado o conjunto das trocas em investimentos, bens e serviços.
A atração pelo mercado brasileiro levou centenas de empresas norte-americanas a se instalarem no país, com contribuição decisiva para o seu desenvolvimento econômico. A criação da Amcham Brasil, em 1919, reflete bem esse movimento. Desejosos de fomentar os laços bilaterais, empresas dos dois lados, entre elas o Citi, decidiram fundar aquela que se tornaria a maior Câmara Americana de Comércio do mundo, fora dos Estados Unidos, e a maior entidade multissetorial do Brasil.
Esse intenso fluxo empresarial fez dos Estados Unidos o país com o maior estoque de investimentos estrangeiros no Brasil, totalizando US$ 167 bilhões, segundo o Banco Central. Para cada quatro dólares investidos no Brasil a partir do exterior, aproximadamente um dólar vem dos Estados Unidos.
Os Estados Unidos também são o principal destino para investimentos brasileiros. Seja pelo tamanho da economia ou facilidade de realizar negócios, as empresas brasileiras buscam o mercado norte-americano como vetor para internacionalizar os seus negócios, produzindo casos de sucesso nos setores de alimentos, moda, finanças, siderúrgico, tecnologia da informação etc.
No comércio de bens, a qualidade das trocas com os Estados Unidos não encontra paralelo no comércio exterior brasileiro, tanto sob a ótica da diversificação como da agregação de valor. Os Estados Unidos são o destino principal para as vendas externas de produtos industriais do Brasil e respondem por cerca de metade de suas exportações mundiais de bens de alta tecnologia.
Em serviços, o mercado norte-americano é o maior destino de vendas e origem de compras do Brasil, representando cerca de 40% de sua corrente de comércio. Predominam, nessas transações, setores sofisticados, como serviços financeiros, tecnologia da informação, manutenção de aeronaves e pesquisa e desenvolvimento.
Por detrás do comércio, não custa lembrar, estão as pessoas. De acordo com o governo norte-americano, as exportações dos Estados Unidos para o Brasil sustentam quase 130 mil empregos naquele país ao passo que as vendas brasileiras para os Estados Unidos mobilizam mais de meio milhão de empregos no Brasil.
Vale destacar, ainda, o rico histórico de cooperação bilateral. Como exemplo, a criação da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) e do setor siderúrgico brasileiro bem como as origens do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), da Eletrobras e do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) são fruto da colaboração entre os governos e entidades de ambos os países.
O marco dos 200 anos nos oferece muitos motivos para celebrar. Mas, sobretudo, nos convida a olhar para frente, com ambição e pragmatismo. O mundo passa por um momento crítico, com desafios sem precedentes, favorecendo uma maior aproximação entre o Brasil e os Estados Unidos.
Ambos os países são cruciais para viabilizar a transição para uma economia de baixo carbono e combater as mudanças climáticas. Brasil e Estados Unidos conduzem um diálogo bilateral promissor em energia limpa e, no ano passado, capitanearam a criação da Aliança Global para Biocombustíveis. O lançamento de uma parceria bilateral sobre energia limpa, incluindo iniciativas sobre combustíveis sustentáveis de aviação (SAF), hidrogênio limpo e outras fontes renováveis, traria fôlego novo para a relação e serviria como um sinal firme para a atuação de investidores.
Ainda no campo ambiental, os dois países poderiam aprofundar a cooperação sobre financiamento sustentável, em apoio ao Plano de Transformação Ecológica do Brasil e na esteira da recente abertura, em São Paulo, do escritório do Development Finance Corporation (DFC), agência norte-americana de apoio ao desenvolvimento. A presidência brasileira do G20 e a realização da COP30 em Belém do Pará abrem janelas valiosas para produzir novos compromissos nessa área.
Os planos de neoindustrialização e a ambição de agregar maior valor nas exportações do Brasil também passam pela intensificação do comércio e dos investimentos com os Estados Unidos. No ano passado, as exportações brasileiras de bens industriais para aquele país, como aeronaves, aço, máquinas e equipamentos, bateram o recorde de US$ 29,9 bilhões, superando a União Europeia e o Mercosul - um lembrete poderoso do papel que os Estados Unidos têm a desempenhar nesse esforço.
No contexto atual de busca por resiliência na produção e por segurança alimentar e energética, os valores compartilhados por Brasil e Estados Unidos os tornam parceiros confiáveis para a diversificação de suas cadeias de fornecimento. A celebração de um entendimento bilateral para identificar oportunidades em setores como minerais críticos, baterias, semicondutores, saúde e fertilizantes atenderia aos interesses dos dois países. Esforços para reduzir a bitributação e outras barreiras ao comércio e aos investimentos, também.
A parceria e a amizade entre o Brasil e os Estados Unidos ao longo dos últimos 200 anos produziram conquistas econômicas e sociais valiosas para ambos os países. Inspirados por esse legado, é hora de mirar o futuro com ousadia e senso de oportunidade de forma a abrir novos horizontes. Um desafio à altura das duas nações.
*Marcelo Marangon é presidente do Citi Brasil e do Conselho da Amcham Brasil.
*Abrão Neto é CEO da Amcham Brasil.
Fonte: Valor
Seção: Indústria & Economia
Publicação: 27/05/2024