Aço barato da China prejudica indústria na América Latina

Aço barato da China prejudica indústria na América Latina

O setor siderúrgico da América Latina está enfrentando uma crise, devido às práticas comerciais desleais da China, que inundou o mercado com aço barato, ameaçando os empregos e a subsistência dos produtores regionais, informou Rádio França Internacional.

“A produção da China afeta as economias latino-americanas, colocando em risco 1,4 milhão de empregos no setor siderúrgico, forçando a suspensão das operações de várias empresas e demissões em massa”, explicou à Diálogo, em 28 de maio, Gabriela Fajardo Mejía, especialista em relações internacionais e doutoranda em Direito da Sociedade Global, da Universidade de Navarra, na Espanha. “[A produção] não está sujeita a padrões ambientais e de qualidade. As empresas chinesas não cumprem as regras de transparência e regulamentação.”

A estratégia da China de vender seus produtos abaixo dos preços de mercado desencadeou uma situação de dumping que afeta gravemente a América Latina. No caso do aço, a produção do país asiático atinge 54 por cento da capacidade global. Somente entre janeiro e abril de 2024, produziu 343,7 toneladas métricas, de acordo com dados da Associação Mundial do Aço.

“A desaceleração dos negócios imobiliários e de construção da China fez com que a demanda interna por aço diminuísse, deixando os produtores dependentes de outros países para compensar o déficit”, disse à Diálogo Henry Ziemer, investigador associado do Programa das Américas do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais. “Como o mercado dos EUA parece cada vez mais desfavorável aos produtores de aço chineses, eles agora estão procurando os países latino-americanos com menos barreiras comerciais para se livrar do excesso de capacidade.”

Além disso, o governo chinês subsidiou a produção e as exportações de aço durante a pandemia. Isso desencadeou uma onda de aço chinês barato que se espalhou por todo o mundo, explicou a mídia colombiana El Tiempo.

México, Chile e Brasil aumentaram significativamente as tarifas sobre as importações de aço provenientes da China, para proteger as empresas nacionais, e outros países da região provavelmente seguirão seu exemplo.

O aço chinês barato está afundando a indústria siderúrgica latino-americana, fazendo com que várias das grandes empresas da região congelem ou encerrem suas operações, disse a Associação Latino-Americana do Aço (Alacero), em um comunicado. Para Alejandro Wagner, o diretor executivo da Alacero de 1º de junho de 2021 a 1º de junho de 2024, a situação está criando um “processo de desindustrialização na região”, disse à BBC.

Em março, a Compañía de Aceros del Pacífico (CAP) do Chile suspendeu as operações em sua emblemática planta industrial de Huachipato, alegando sua incapacidade de competir com os preços chineses e enfatizando que o dumping da China afetou o desenvolvimento econômico e social da região.  A empresa retomou suas operações depois que o governo impôs um aumento da sobretaxa sobre as importações de aço chinês. O conselho de administração de Huachipato expressou sua esperança de que a medida se torne definitiva.

Além disso, na Colômbia, a indústria siderúrgica pede que a concorrência no setor seja justa, pois estão sofrendo devastadores efeitos econômicos. “Estamos sofrendo uma concorrência desleal há dois anos, por meio de importações maciças da China e da Rússia a preços predatórios, até 40 por cento abaixo dos preços internacionais e de mercado”, disse Fabio Galán, presidente da Acerías Pazdelrío, ao jornal El Colombiano.

“No passado, houve relatos de que as minas de ferro no México, invadidas por cartéis do crime organizado, desempenharam um papel importante no envio à China de navios de minério de ferro saqueado, que foi então convertido em aço”, afirmou Ziemer. “Esses relatórios fornecem mais evidências de que as práticas comerciais injustas e opacas da China criam incentivos perversos no hemisfério, que podem encorajar as organizações criminosas e minar a qualidade da governança.”

A siderúrgica Gerdau do Brasil anunciou a suspensão de trabalhadores em sua usina de São José dos Campos, em São Paulo, devido à concorrência desleal do aço chinês. Gustavo Werneck, presidente da empresa, disse à mídia brasileira InfoMoney que essas medidas são apenas o primeiro passo para conter a onda chinesa.

“Além disso, a China subsidia suas empresas do setor, o que lhes permite reduzir seus custos. É principalmente preocupante que os padrões de qualidade e ambientais para essa produção não sejam um fator levado em conta pelo governo chinês, mas é ainda mais preocupante que não sejam um fator a ser considerado pelos compradores de aço nos países latino-americanos, que, em detrimento de sua própria indústria local, são influenciados principalmente pelo preço baixo”, acrescentou Fajardo Mejía. “Enquanto as siderúrgicas latino-americanas emitem 1,55 toneladas de dióxido de carbono (CO2) por tonelada de aço produzido, a China emite 2,24 toneladas de CO2, o que representa 45 por cento a mais de poluição”.

A imposição de tarifas sobre o aço da China como resposta a suas práticas desleais também ressalta o potencial de tensões comerciais entre os países latino-americanos e a China, com a possibilidade de retaliação do país asiático, conhecido por sua diplomacia coercitiva.

Por exemplo, a China proibiu em 2016 produtos à base de soja provenientes da Argentina, em resposta a ações antidumping de longo alcance, explicou o jornal argentino La Nación. Em 2019, após a prisão de uma executiva da Huawei em Vancouver, a China suspendeu todas as compras de sementes de canola canadense, informou a rede de notícias AP.

“A China produz mais aço do que os seguintes nove países produtores de aço juntos, o que lhe dá uma ferramenta poderosa para influenciar os preços e desestabilizar as economias locais”, concluiu Ziemer. “No entanto, o fato de essa última rodada ter como alvo países como Chile e México, pode representar uma oportunidade para que os Estados Unidos coordenem com os países latino-americanos formas de mitigar as práticas comerciais desleais da China e proteger suas indústrias nacionais.”

Fonte: Diálogo Chino
Seção: Siderurgia & Mineração
Publicação: 01/07/2024